Havia acabado de descer na estação. Aquela neblina habitual
começava a dar o ar da graça por cima das montanhas, dando o sinal de que poderia "tomar" o local a qualquer momento. Caminhou rapidamente pela rua
principal, até o início da trilha sob o olhar desconfiado daquela senhora na
janela, acostumada a ver tanta gente realizando o mesmo trajeto.
Um cachorro latia aqui e outro ali, mas fora isso, era um silêncio que dava pra
ouvir os próprios passos nas ruas de paralelepípedo. Lembrou-se da infância, de um primo que quando tinha oito anos, tinha uma imensa dificuldade em dizer aquela palavra (pa-ra-le-le-pi-pe-no) e riu sozinho. Em
dez minutos, estava no meio do mato a caminhar com aqueles barulhos típicos de floresta.
Um passarinho ali, um barulho de cachoeira aqui, um bicho rastejando sob as folhas que não dava
pra ver o que era e...”vamos em frente!”..pensou. Quase
duas horas de caminhada neste cenário e chegou ao topo da montanha. Eram quase 17:00
h. "A neblina atrasou, acho que dá pra continuar”. Tinha que realizar uma
escolha, dormir ali, nas alturas pra continuar no dia seguinte ou tentar
descer a montanha. Equivocadamente, resolveu continuar. E é aquela coisa. Com natureza, não se brinca, não dá pra adivinhar. É preciso informações mínimas,
seguras, que podem até não ser tão seguras assim em determinado momento, já que o homem não tem domínio
sob as forças da natureza. Ele pode, no máximo ser um “parceiro” e trabalhar
com elas. Além disto, torna-se necessário uma preparação mínima para poder encarar certos
desafios. Começou a caminhar e em menos de trinta minutos, uma névoa “cobriu” completamente a trilha,
deixando-o totalmente perdido. Não tinha aparelho de GPS,
sinal de celular nem pensar. E o pior..estava sozinho.
Tirou a lanterna da mochila e tentou iluminar o caminho. Não
dava pra ver mais que um metro e meio e de vez em quando a trilha se dividia em três. E a temperatura,
caía...caía um pouco mais. “Por enquanto dá pra agüentar”. Naquele cenário, caminhou
por mais 10 minutos quando percebeu que o mato começou a fazer um “sanduíche”
no caminho. Se você anda numa trilha consolidada, normalmente isso não ocorre.
Isto era um sinal, estava perdido, no meio da neblina e num lugar cheio de
precipícios. “E agora?” pensou. Parou, sentiu uma ponta de desespero subir pelo
tronco e sentou no chão. Tomou um pouco de água, fechou os olhos, começou a refazer na memória todo aquele trajeto que havia realizado anteriormente em outros anos. Respirou
profundamente por uns dez minutos e começou a rezar. Pediu aos que "habitavam" aquele ambiente para que lhe ajudassem e orientassem o caminho. Que
estava ali e tinha um profundo respeito por tudo “aquilo” e assim como entrou, gostaria
de sair e chegar ao destino. Uma sensação de paz foi se aproximando e levantou. Olhou em volta, pensou um pouco mais e
escolheu a trilha a direita. Andou devagar alguns passos pois sentia que era uma descida. Foi indo com cuidado e logo uma parte plana, surgiu à frente. Neste
momento, logo atrás da trilha, vindo de outro caminho, uma pessoa apareceu
descendo rapidamente.
Não estava vestido com equipamentos de trilheiro. Uma
mochila, improvisada nas costas, um chapéu, um pedaço de madeira como
apoio nas mãos. Não hesitou em perguntar. “Amigo, tudo bem? Pode me auxiliar? Qual
é o caminho correto aqui pra chegar ao acampamento? ” Só no intervalo destas palavras,
o cara tinha dados uns dez passos e já se colocava a frente da trilha. Ele
apenas olhou pra trás sem virar o corpo completamente. “A partir deste ponto,
siga sempre ao lado direito que vai margeando a encosta da montanha nas duas bifurcações que encontrar". "Vá em frente que dá tempo, antes
que escureça”. “Ah obrigado mesmo!”. Passou a acompanhá-lo a certa distância e
tentou se aproximar. Aquele homem com quase cinqüenta anos andava tão rápido e era notório que conhecia a trilha. Tentou andar mais rápido pra acompanhá-lo, mas
nunca conseguia diminuir muito a distância. Com a mochila pesada foi
cansando. Mas nisso, havia se passado uns 10 minutos, tentando andar numa marcha igual
ao “trilheiro” da sua frente. Desistiu. O cara sumiu no caminho. Um pouco mais
a frente, a neblina se dissipou e caminhou por mais uma hora, até que chegou ao
destino. No acampamento, tentou encontrá-lo para agradecer. Olhos por uns
minutos em tudo aquilo. Ele não estava lá. Nunca mais o encontrou. “Obrigado
amigo!”, disse em pensamento.
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( de forma casual, me lembrei desta bela canção para ilustrar)
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